Vinho ao Vivo 2018, Festival Europeu do Terroir, 13 e 14 de Julho
Entrevistas realizadas por Nadir Bensmail d’Os Goliardos
Vitor Claro (Alentejo, Portalegre)
1. Como surgiu o enraizamento na zona de Portalegre onde começou a tua vida de produtor ?
Começou tudo por acaso. Eu trabalhava na cozinha de uma unidade de enoturismo. Embora conhecesse já algumas adegas e produtores e tivesse a sorte de ter provados alguns vinhos que me fascinaram e me fizeram querer experimentar fazer o meu próprio vinho.
Em 2014 conheci a Rita e a vinha onde sempre comprei uvas ficou sem rendeiro. Eu tinha o meu restaurante e a Rita trabalhava como arquitecta. Nesse ano tomámos a decisão de alugar a vinha.
Em 2015 foi o primeiro ano em que assumimos a responsabilidade de agricultura dos nossos primeiros 2ha. Ainda em 2015 procurávamos um armazém e falaram-nos de um pavilhão de um amigo familiar, que acabou por nos ceder o espaço. Quando o abrimos vimos cubas de inox, uma prensa e algumas dornas de plástico. Atrás do armazém havia 1,5ha de vinha que alugámos também.
Em 2016 fizemos uma grande remodelação no restaurante que nos virou o negócio ao contrário. No fim desse ano tínhamos de tomar uma decisão. Os vinhos estavam a crescer como negócio e o restaurante mostrava-se cada vez mais insustentável. Acabámos por alugar também as vinhas da Beira Alta.
Em 2017 reenxertamo-nos. Fechámos o restaurante o trabalho de arquitectura. Alugámos mais 2ha de vinha em Carcavelos e a vida vai indo.
2. Conciliar o teu fascínio pelos vinhos leves europeus setentrionais e a produção num país mais quente : como se traduz nos teus vinhos?
É uma questão de filosofia. Existem vinhos na Borgonha que são feitos a pensar em extracção. Bordéus era até há um século atrás uma zona de vinhos de cor leve e aberta (daí os claret) historicamente, e é hoje refereciada pelos vinhos opulentos e musculados. Na Austrália existe uma linha de vinhos modernos e de grande porte (a maior parte de por exemplo os Penfolds são assim, e o topo de gama Grange é um vinho extremamente fino) mas não só. Não acredito que se possa referenciar Portugal como unicamente um terroir típico quente. As nossas vinhas no Alentejo são viradas a norte, a 650m de altitude. Não se pode comparar com vinhas na Vidigueira (por exemplo, apenas) a 50m de altitude, em planície, regadas e com 18h de sol diário de Maio a Setembro. E acredito ainda que independentemente do sítio – origem, castas e clima – podemos fazer pequenos detalhes que alteram muito o estilo que se quer. O dito trabalho de adega: remontar, pisar, extrair, apanhar mais cedo ou mais tarde… Isso tudo faz o perfil de um vinho. Claramente que no que de nós depende, fazemos tudo com foco
3. Pontos comuns e divergentes entre a zona da Beira Interior (Colmeal) e o Norte Alentejo (Fox trot, Dominó, …)?
Altitude e vinhas velhas de castas autóctones. Isso é o ADN da Beira e Norte Alentejano.
Tem uma diferença grande nas castas (arrisco dizer que talvez não haja nenhuma em comum) e no solo: franco argiloso na Serra de São Mamede e granito-arenoso em Pinhel. E, claro, a chuva. Não chove na Beira Alta.
Temos diferenças gritantes, sim, entre estes dois terroirs e as vinhas de Lisboa. Difere entre clima continental e clima atlântico.